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3 de ago. de 2011

Expectativas O1 - O Poeta e a Cega. / Parte 2


Anna foi para a cozinha preparar chá e Peter a seguiu. Ela prestava bastante atenção no "toc toc" que a bota dele fazia no assoalho... Era engraçado.
Antes de preparar o chá ela sentiu cheiro de barro e alecrim, pensou ser o jardim da sua casa mais o cheiro estava por perto.
- Você veio pelo vale? - Ela perguntou.
- Sim. Como sabe?
- Por causa do cheiro de alecrim. Eu gosto. Mais só encontra no vale.
- Você me assusta sabia? - Anna riu e pensou "Até que tudo esta se saindo bem." Mais depois desejou não ter pensado por medo das coisas acontecerem ao contrario.
- Anna... - Chamou Peter e a esperou responder.
- Sim?
- Você se importa de me contar o que aconteceu que te deixou assim... Cega? - Sim, ela se importava... Porque lembrar a machucava. Depois do acontecido ela passou a achar que a culpa de tudo era de Peter... Mais depois dos anos foi deixando essa estúpida idéia de lado, não era certo o culpar.
Ficou em silencio enquanto esperava o chá ferver. O cheiro de canela bateu em seu rosto e a aqueceu por instantes. Peter se levantou e pegou duas xícaras que estavam no armário. Ele a segurou pela mão direita e a levou até a mesa. Ela os serviu e se sentou... Por algum motivo ela se sentiu no dever de contar pra ele e começou:
- Se lembra do seu ultimo aniversário aqui? - Ela o esperou assentir e continuou. - Eu ouvi nossas mães conversando. Sua mãe queria ir embora mais minha mãe achava melhor ela esperar você crescer o suficiente para cuidar dela... Mais ela não quis. Eu fiquei muito triste e fiquei no quarto esperando você acordar pra gente se esconder e não deixar você ir, mais você não acordou e eu dormi.
Quando eu acordei você já tinha ido embora, e tinha levado tudo... Menos seu livro preferido e havia deixado também uma rosa do pequeno jardim que eu cuidava. Havia sido a primeira vez que eu havia me sentindo tão impotente e fraca daquele jeito. Eu fiquei desesperada e corri pra ver se eu conseguia alcançar vocês, por algum motivo eu acreditei que vocês poderiam estar por perto ainda, eu escorreguei no chão porque a minha mãe havia acabado de o limpar e tentei me segurar em algo mais próximo possível... E dá pra ver que não deu muito certo. Eu acabei batendo a mão em uma panela com agua fervendo e por sorte não caiu toda a agua no meu rosto, mais o suficiente pra me ferir. Fiquei com o rosto enfaixado por dois meses e meus olhos ardiam muito. Eu pensei bastante nas chances de estar cega. Mais quando tive certeza eu não quis acreditar. Imagine só... Uma criança de nove anos ficando cega de uma hora pra outra, é... Desesperador. O que eu poderia fazer? Brincar? Correr? Com o tempo eu fui me tornando uma pessoa fria e sozinha. Culpei você e depois a vida. Mais acabei chegando a conclusão que não era culpa de ninguém. Me esforcei pra cuidar mais de mim mesma sem precisar tanto da minha mãe, principalmente agora que ela esta doente. E graças a Deus eu consegui. Tirando o fato de que é triste não poder fazer nada do que você queira, eu me conformei. E acredite... Eu vivo bem hoje em dia. Mais eu faria qualquer coisa pra poder enxergar outra vez... Mesmo que só por um dia. - Houve uma grande pausa, e o que quebrou o silencio o foi o suspiro de Peter.
- Então fique feliz... Você não perde lá muita coisa enxergando as coisas do mundo. Ele não é tão bom quanto você imagina. E você o imagina um mundo belo porque você vive no mundo em que você criou... É como viver de olhos fechados ou sonhando. Tem lá suas vantagens.
- Ninguém sonharia com um acidente que te deixaria cego.
- Mais veja o lado positivo... A tanta tristeza no mundo e você só enxerga a luz... Você pode imaginar o mundo quadrado e ter ele assim, porque... É o SEU mundo.
- Não, eu não enxergo a luz eu enxergo a escuridão.
- Quando você vai dormir... Assim que você fecha seus olhos você também só enxerga escuridão, e isso não impede ninguém de ter lindos sonhos.
- Nem de ter pesadelos.
- Ah, vamos lá Anna... Seja cínica e tão pessimista. Você só enxerga o lado ruim das coisas? - Anna sorriu.
- Eu sou cega, esqueceu? Eu não enxergo nada. - Dessa vez Peter também sorriu. Não que fosse engraçado que Anna estivesse cega, mais por ela não estar mais fazendo daquilo uma culpa, ou conspiração do mundo. Ela estava aceitando e rindo daquilo. E havia passado por cima de um grande obstáculo e Peter achou aquilo bonito de se ver.