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19 de ago. de 2011

Sem que insista / O Poeta e a Cega - Parte 1O



- Anna, Anna, Anna. - Ela ouviu alguém insistir em chama-la. Não queria acordar, não queria ter que encarar aquela realidade. Qualquer outra realidade ela até encararia tranquilamente, mais aquilo? Parecia peça do destino.
Teve certeza de estar nos braços de alguém, pensou que seria Peter mais se enganou. "Eu nem sei o nome dele... Como posso o chamar de pai?" Ela pensou. E sentiu uma certa raiva. Afinal de contas... Tudo bem que ele era o pai dela, mais isso não o fez pensar antes de deixa-la, antes de deixar a sua mãe. Se ele tivesse ficado e ajudado a Judite talvez ela até estivesse viva.
Ele foi embora... Sem muitas delongas, sem mandar cartas pelo menos para dizer se estava bem ou não. Ele sempre fora ausente e de repente queria a levar embora. Ela não podia. É claro que não.
Anna resolveu acordar e resolver esse assunto. Resolveu que não iria embora e que seu pai ouviria umas poucas e boas. Se levantou lentamente, ainda estava um pouco tonta e se apoiou em Peter.
- Como você está bela, minha filha. - Disse seu pai.
- Por favor... Não me chame de minha filha. Eu nem siquer conheço você. - Ela disse cuspindo veneno. Victor sorriu e se aproximou de Anna.
- Isso não é tão difícil de resolver... Eu sou Victor, o seu pai. Vim busca-la para ir morar comigo na Europa e ter uma vida digna. Longe desse campo.
- Eu não quero ir... Quero dizer... Eu não vou!
- Você não decide. É menor de idade, então facilite as coisas para mim, Anna. Tenho certeza que você não é tão infantil quanto quer parecer ser.
- É claro que eu decido. Pelo que eu sei você deixou a mim e a minha mãe quando eu havia acabado de nascer. Nunca ligou para saber como eu estava e o que acontecia comigo. Muito menos com a minha mãe, que se você estivesse aqui talvez teria cuidado dela melhor do que eu... A propósito, eu sou cega. Você sabia?
- Eu sei de tudo que se passa por aqui Anna.
- Só não se importa.
- É claro que eu me importo... Veja só, convenci um grande amigo meu a encaminhar Peter para Los Angeles para publicar o seu livro. Peter será um grande poeta... Mais isso... Se você vier comigo. Se você não vier, claro, vou te levar a força e Peter não vai conseguir ser escritor nem de placa de banheiro.
- Anna... Não vá. - Peter pediu.
- Mais Peter você vai ter uma grande oportunidade, imagine. É o seu sonho.
- Anna, eu troco ele por você... Eu suplico... Não vá.
- Você é um poeta, Peter. E eu sou uma cega. Eu não tenho o que você quer.
- Você é o que eu quero. - Victor tomou a frente de Peter e tocou os ombros de Anna.
- Imagine só Anna. Peter teria tudo. Ele seria um prestigiado escritor. Um grande poeta. Ele realizaria o sonho dele. E aqui... Aqui não é lugar pra você. - Ele disse num tom meio enojado ao se referir do lugar.
- Você me promete? - Perguntou Anna para Victor.
- Anna por favor não... - Ele disse com a voz trêmula. Se não estava chorando, estava quase.
- Peter... Me desculpe. Não posso fazer isso com você. É o seu sonho. Entenda que também é importante para mim ver você bem.
- Então fica! Porque se você for eu não vou ficar bem. Longe disso. Eu adoeceria.
- Não posso... E por favor me entenda. - Anna estendeu os braços e Peter a seguro. Ela se aproximou dele e   o selou a boca. "Eu te amo." Ela sussurrou e ele sentiu seu corpo ficar gelado e seu coração palpitar. "Sempre amei... E sempre vou te amar." Ela sorriu e foi se afastando.
- Victor... Eu tenho uma gata... Eu quero leva-la.
- Uma gata sarnenta? Faça-me o favor Anna. Não a necessidade.
- Tem certeza? - Ela perguntou nervosa.
- Argh! Tudo bem...Pegue seu saco de pulgas. Não precisa fazer suas malas, você vai comprar roupas novas.
- Peter pode ir busca-la para mim?
- Claro. - Ele disse e se foi. Rain estava no quarto de Anna como sempre, ele a pegou e a colocou em seu colo.
- Rain... - As lágrimas se acumularam tão rapidamente em seus olhos que foi impossível conter. - Cuide dela por mim... Eu prometo que logo eu irei busca-la. Prometo ir buscar vocês. Cuide dela, ok? - Sem ter mais o que pedir a Rain ele desceu as escadas como quem carregava o dobro do peso do corpo, talvez até o triplo.
Ele entregou Rain para Anna que o abraçou forte e depois se foi. Victor a segurou pela mão e a levou até um carro preto.
Anna sorriu e acenou para Peter antes de entrar no carro e ele apenas acenou de volta. Não havia motivos para sorrir. Ele nem sabia se havia algum motivo.
Victor se aproximou de Peter e lhe entregou um cheque de novecentos mil dólares.
- Compre algumas roupas novas. Ajudarei no seu progresso o mais rápido possível. Obrigada por ter cuidado de Anna. - E assim ele se foi. Levando junto dele o que ele havia sido e o que ele tinha conquistado. Estava levando embora quem ele amava e isso doía demais.
Assim que Victor entrou no carro e bateu a porta Anna suspirou. Tão dolorosamente que não aguentou e chorou, chorou por um logo tempo que adormeceu. Rain estava aninhada em seu colo o tempo todo, ela era parte dele. Era parte de uma bela lembrança e aquilo seria para toda vida.

Continua...